Crédito privado: o que saber antes de investir em empresas de energia elétrica
Empresas citadas na reportagem:
Emissoras de dívida do setor de energia elétrica começaram 2025 com fundamentos robustos e ampla liquidez, com destaques para Eletrobras, Taesa, Alupar, Equatorial e Energisa, afirmou o Itaú BBA em relatório sobre investimento em crédito privado.
O ambiente segue favorável à diferenciação, com empresas que combinam ativos regulados, flexibilidade operacional e disciplina de capital mais bem posicionadas para sustentar seus perfis de crédito, afirma o relatório da equipe de Lucas Queiroz.
A Eletrobras mantém forte geração de caixa e perfil de amortização diluído. Taesa e Alupar mantêm dívidas escalonadas e baixo risco de refinanciamento. Equatorial e Energisa, apesar de operarem com alavancagem (endividamento) mais elevada, apresentam histórico consistente de execução e acesso regular ao mercado de capitais.
O setor vem passando por expansão de investimentos em transmissão e desafios na distribuição devido à limitação nos reajustes tarifários, além de um cenário climático que exigiu maior uso de termelétricas.
Empresas reguladas com operação eficiente vêm mantendo margens elevadas, enquanto geradoras dependentes de fontes intermitentes ou hídrico-intensivas enfrentaram maior volatilidade de receita e custo.
Enquanto isso, a rápida evolução da geração distribuída e os avanços regulatórios em concessões e remuneração de ativos estão exigindo adaptações das empresas do setor. Nas transmissoras, o desempenho seguiu resiliente, com margens elevadas e geração de caixa previsível.
Alupar
Empresa transmissão e geração de energia tem alavancagem regulatória de 3,5 vezes o lucro operacional (Ebitda), levemente acima do observado em 2023 (3,4 vezes). Mas companhia tem acesso recorrente ao mercado de capitais e disciplina na alocação de capital.
A distribuição de dividendos abaixo da média do setor, apesar da sólida geração de caixa, vem sendo questionada por analistas.
A gestão reafirmou a política de payout (proporção do lucro líquido distribuído aos acionistas na forma de dividendos) mínimo, destacando o crescimento acelerado como justificativa para retenção de lucros.
Eneva
A escassez hídrica em determinadas regiões e os ventos fracos no segundo semestre exigiram maior despacho térmico para garantir a segurança do sistema. Isso favoreceu companhias com forte atuação em geração térmica, como a Eneva.
A empresa que atua em exploração, produção de gás natural, e na geração de energia elétrica, fez entregas relevantes de projetos em 2024. Apesar disso, a Eneva conseguiu reduzir o endividamento, fruto em grande parte da captação de recursos via oferta de ações.
Sua alavancagem caiu de 4 para 2,4 vezes em 2024. Excluindo os efeitos de um ajuste contábil (impairment), a alavancagem seria de 2,2 vezes em dezembro.
A percepção dos investidores sobre a companhia passou de foco em execução e desempenho operacional em 2023 para atenção à volatilidade contábil e sustentabilidade do crescimento em 2024.
Em 2023, a alavancagem elevada e os desafios de estabilização da planta Jaguatirica II eram os principais pontos de atenção.
Novos questionamentos surgiram sobre os efeitos contábeis do impairment, a sensibilidade da empresa a variações cambiais e a performance da Futura I, que teve impacto por indisponibilidade parcial e necessidade de comprar energia para honrar contratos.
A gestão respondeu com transparência, detalhando os ajustes contábeis e reforçando que os efeitos são majoritariamente não caixa. O tom da companhia em 2024 é de solidez, foco em expansão estruturada e domínio dos riscos operacionais.
Auren
A geradora e comercializadora de energia elétrica com foco em fontes hidrelétrica, eólica e solar fez recentemente a aquisição da Esfera Energia e uma joint venture com a Vivo. Em 2024, o desempenho da Auren foi impactado por fatores operacionais e climáticos, ao mesmo tempo em que consolidou a aquisição da AES Brasil.
A preocupação maior agora é outra: a alavancagem elevada e os desafios de integração da AES Brasil. A geração de caixa robusta, aliada à liquidez elevada e ao perfil de dívida alongado, assegura flexibilidade financeira para a recomposição gradual dos indicadores, segundo o relatório.
A alavancagem medida por dívida líquida/Ebitda ajustado subiu de 3,6 para 5,7 vezes em 2024. Mas a companhia encerrou dezembro com posição de caixa suficiente para cobrir os vencimentos de curto e
médio prazo (R$ 6,1 bilhões até 2027).
CPFL
Uma das maiores do setor no país, a CPFL tem ativos em distribuição, geração, transmissão e comercialização de energia.
Em 2024, o aumento da demanda por energia sustentou o crescimento do volume distribuído. Mas as enchentes no Rio Grande do Sul pressionaram os resultados em distribuição, o que levou a resultados consolidados mistos.
A companhia conseguiu amenizar preocupações do mercado com inadimplência e controle do endividamento. Mas a renovação das concessões detidas pela CPFL ainda segue como foco de atenção.
Segundo Queiroz e equipe, a perspectiva de crédito da CPFL é estável, apoiada por sua capacidade de geração de caixa e execução estratégica, mas os efeitos de condições climáticas adversas e mudanças regulatórias continuarão no radar.
A alavancagem da CPFL teve leve alta em 2024, chegando a 2,07 vezes, mas permaneceu abaixo do limite contratual de 3,7 vezes. E as disponibilidades de caixa caíram 32,5% no ano, para R$ 3,5 bilhões.
Eletrobras
Maior do setor na América Latina, a empresa atua em geração, transmissão e comercialização de energia. Após a privatização, a Eletrobras reduziu a alavancagem financeira de 2,1 para 1,5 vez em 2024, com disciplina na gestão da dívida.
Atualmente, seu caixa de R$ 35,5 bilhões é suficiente para cobrir as obrigações de curto prazo de quase três anos.
O acordo firmado com o governo federal em fevereiro tirou da frente um importante foco de preocupação do mercado. Mas o impacto do plano de investimentos, passivos de contingências e garantias dadas a empresas não consolidadas, além do impacto da Selic alta sobre a despesa financeira seguem no radar.
O indicador de alavancagem dívida líquida/Ebitda ajustado encerrou 2024 em 1,5 vez, comparado a 2,1 vezes de 2023. O caixa disponível de R$ 35,5 bilhões conseguia as obrigações de curto prazo em 2,8 vezes.
Energisa
A empresa que atua em distribuição, transmissão e geração de energia teve em 2024 um desempenho operacional consistente, segundo os analistas. A geração de caixa operacional foi recorde, o que permitiu financiar parte dos investimentos, mantendo a estrutura de capital sólida.
Os analistas elogiaram a transparência da gestão nas práticas contábeis e do foco em execução com qualidade. Segundo ele, a diversificação geográfica e o foco regulatório dão resiliência ao modelo de negócios, mesmo com pressões no setor de distribuição.
A alavancagem de 3 vezes foi praticamente estável em 2024. E a posição de caixa de R$ 8,9 bilhões cobre com folga os compromissos de curto prazo (R$ 6,7 bilhões).
Equatorial
Terceira maior do País em distribuição de energia, com 14 milhões de clientes, a Equatorial expandiu operações para o segmento de renováveis e para saneamento, com a compra de 15% da Sabesp.
No mês passado acertou a venda das operações de transmissão à Verene Energia por R$ 9,4 bilhões, o que pode ajudar a reduzir o endividamento, que ainda assim deve seguir elevado no curto prazo. Segundo o Itaú BBA, isso é amenizado em parte pela previsibilidade de receitas nos segmentos regulados.
Sua alavancagem líquida ficou estável em 3,3 vezes em 2024 e a posição de caixa de R$ 13,7 bilhões
representava 2,2 vezes a dívida de curto prazo.
Taesa
Uma das principais empresas de transmissão de energia do País, a Taesa investiu R$ 1 bilhão em cinco empreendimentos em 2024, com previsão de entrada em operação até 2028. Para 2025, o investimento previsto varia entre R$ 1,6 bilhão e R$ 1,8 bilhão.
Segundo o BBA, do ponto de vista de crédito, a Taesa é um nome de baixo risco, dada a previsibilidade das receitas. O principal ponto de atenção é a execução do extensivo plano de investimentos e seu impacto na geração de caixa e estrutura de capital, dado que sobrecustos e atrasos podem pressionar a alavancagem.
Sua alavancagem líquida caiu de 4,2 para 4 vezes em 2024 (considerando proporcionalmente empresas controladas em conjunto e coligadas). A posição de caixa somou R$ 757 milhões no fim de dezembro, o que somando os recursos da debentures de R$ 650 milhões captados em janeiro de 2025, é suficiente para cobrir 100% da dívida de curto prazo.
ISA Energia
A percepção de risco de crédito da ISA Energia melhorou nos últimos meses, refletindo maior confiança dos investidores na capacidade da empresa de sustentar seu crescimento e honrar seus compromissos financeiros.
Isso é importante considerando que sua alavancagem financeira, medida pela relação dívida líquida/Ebitda, subiu de 2,4 para 2,7 vezes no último ano, aproximando-se do teto contratual com credores, de 3 vezes.
Apesar disso, diz o BBA, a companhia demonstrou resiliência ao expandir sua base de ativos e garantir um fluxo de caixa operacional sólido.
A liquidez confortável e a estrutura de dívida com vencimentos alongados permitem que a empresa continue investindo em projetos estratégicos sem comprometer sua estabilidade financeira.
Contudo, alguns riscos permanecem no radar dos investidores. A empresa enfrenta desafios relacionados à judicialização de passivos e o término da remuneração da Rede Básica do Sistema Existente (RBSE), que pode pressionar a geração de caixa.
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