Liminar põe em xeque venda de ativos de Eike Batista para pagar credores

Em mais uma etapa do polêmico processo de quebra da MMX Sudeste, uma das empresas do empresário Eike Batista, o administrador da massa falida da companhia recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para buscar reverter uma decisão interpretada como prejudicial aos credores em Minas Gerais.
O recurso, encaminhado pelo administrador Bernardo Bicalho, foi feito após uma decisão liminar do ministro do tribunal Paulo de Tarso Sanseverino, que determinou a suspensão temporária da venda ativos do empresário e de outras empresas do grupo.
A suspensão atingiu, em especial, a perspectiva de venda de uma debênture pertencente aos Batista. Os papéis foram emitidos há alguns anos pela multinacional Anglo American.
Havia a expectativa entre credores de que a possível venda desse ativo pudesse finalmente servir de fonte para que a empresa pagasse, ao menos, parte de sua dívida.
São cerca de 600 credores que tentam receber, desde 2014, um montante de aproximadamente R$ 1,2 bilhão. Entre eles, aproximadamente 400 são ex-funcionários da MMX Sudeste e 200, empresários que tinham contratos de fornecimento com a empresa. Tanto os funcionários quanto os empresários são, em sua maioria, de Minas.
Na liminar, expedida em 13 de setembro, além de suspender a venda do ativo, Sanseverino também estabeleceu a Justiça do Rio de Janeiro como o juízo competente, em caráter provisório, “para solucionar eventuais medidas urgentes que se fizerem necessárias, em especial aquelas relativas à prática de atos de disposição patrimonial nas massas falidas”. A avaliação do magistrado foi que havia o risco de conflito de competências entre as decisões da Justiça em Minas e da Justiça no Rio de Janeiro.
A liminar atendeu a pedido dos advogados de Batista. Em dezembro, o magistrado havia rejeitado a tese de conflito de competências nas falências que correm no Rio e em Minas. Mas voltou atrás agora.
Os advogados vinham fazendo críticas à forma como o processo estava sendo conduzido em Minas e afirmam que a liminar serviu de “freio de arrumação”.
Desde o início do processo de recuperação judicial da MMX Sudeste, em outubro de 2014, as decisões sobre o processo estavam na Justiça mineira. E, até então, a Justiça do Rio de Janeiro estava incumbida do processo de falência de outra empresa do grupo, a MMX Mineração e Metálicos.
Procurado pela reportagem, Bernardo Bicalho disse que só se manifestará pelos autos, mas informou que ingressou com recurso no STJ. Ao encaminhar o recurso, ele expõe a preocupação de que, uma vez no Rio, o processo de falência deixe de considerar a possibilidade de atingir o patrimônio financeiro da família Batista – em especial a debênture – como forma de ressarcir credores. Esse caminho foi aberto em Minas Gerais.
A decisão de Sanseverino também foi recebida com preocupação por parte dos credores.
O advogado Daniel Guariento, do escritório Machado Meyer Advogados, representa quatro empresas credoras da MMX Sudeste (três delas pertencentes a um mesmo grupo) que têm a receber cerca de R$ 450 milhões.
“Essa decisão traz enorme preocupação e insegurança aos credores da MMX Sudeste, que correm o risco de ver as falências da MMX unificadas, com a consolidação substancial dos débitos, o que, na prática, inviabiliza o pagamento dos credores quirografários”, afirmou ao Valor. “Com a consolidação, a falência da MMX Sudeste, que em princípio é superavitária, se torna deficitária”, acrescentou.
A questão levantada é que no Rio existem créditos tributários, que têm prioridade sobre outros credores. E que, uma vez unificados os processos de falência, a venda de ativos que poderiam saldar a dívidas dos credores em Minas acabaram sendo usados para saldar o passivo tributário no Rio.
Guariento disse que os credores por ele representados pretendem pleitear seu ingresso no conflito de competência, “defendendo que seja mantida a separação das falências” e, esclarecidas as condições de venda de ativos da MMX Sudeste.
Ariel Weber, um dos advogados de Eike Batista, disse à reportagem que a suspensão da venda dos ativos, foi necessária para evitar que ela fosse vendida por um preço que a defesa considera vil.
A transferência do processo de Minas para o Rio de Janeiro, na expectativa da defesa, pode dar mais transparência aos atos.
Há outro ponto importante. A Justiça em Minas vinha adotando um entendimento jurídico que passou a considerar o patrimônio financeiro da família – o que inclui a debênture – como forma de ressarcir os credores foi adotado pelo administrador da massa falida da MMX Sudeste. O instrumento se chama incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ).
“No Rio de Janeiro, IDPJ teve a liminar indeferida há um tempo”, disse Weber. “O processo normal de falência começa pela venda dos ativos da empresa. E isso não se iniciou. Normalmente não se começa a vender o patrimônio pessoal dos sócios”, acrescentou.
“A defesa quer a resolução da questão. Se a resolução passa primeiro pela venda dos ativos da empresa e depois se faz um encontro de contas, não sei dizer. Vamos esperar o juízo que vai ter aval de competência pelo STJ para conduzir isso de uma forma, talvez, mais transparente.”
A possibilidade de que no Rio, o processo da MMX Sudeste não use patrimônio da família para saldar credores foi mencionada por um dos filhos de Eike, Thor Batista, em uma troca de mensagens por Whataspp com Bernardo Bicalho em 15 de setembro. Depois de falar sobre as tentativas de uma audiência com a juíza em Belo Horizonte, Thor escreveu: “faz mais sentido eu esperar porque pelo visto vai migrar tudo para o Rio e aqui o juiz e aj [administrador judicial] são contra existência do IDPJ.”
A troca de mensagens – lida pela reportagem – foi registrada por Bicalho no cartório de 9º Ofício em Belo Horizonte. A ata é um documento público. Bicalho, por meio de sua assessoria, disse que adota como regra registrar em atas notariais todos os atos extrajudiciais que possam ter interferência em processos de falência.
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