Série destaca o lado sociopata do megainvestidor Bernie Madoff

Paralelamente à sua agenda lícita, ele conduzia o maior esquema de pirâmide já descoberto

Bernie Madoff (1938-2021): megainvestidor, ex-presidente da Nasdaq e filantropo acima de qualquer suspeita. Por décadas, sua credibilidade em Wall Street foi tamanha que chegava a intimidar o FBI e analistas da CVM, mais propensos a acreditar na palavra de Bernie que checar os fatos. Foi só em 2008, na esteira do colapso financeiro global, que a máscara finalmente caiu. Paralelamente à sua agenda lícita, Madoff conduzia o maior esquema de pirâmide já descoberto. Um golpe avaliado em cerca de US$ 65 bilhões.

Dividida em quatro episódios, a minissérie documental “Bernie Madoff: O Golpista de Wall Street” repassa a saga criminosa de Bernie desde suas origens humildes no Queens, quando pediu US$ 500 emprestados ao sogro para abrir uma pequena firma de corretagem de ações, a Bernard L. Madoff Investment Securities LLC.

A empresa ascendeu rápido, entretanto. No começo dos anos 1970, tornou-se pioneira no trading informatizado, o que lhe conferiu grande vantagem sobre a concorrência.

Uma década mais tarde, Bernie já era um dos maiores figurões de Wall Street, dono de uma considerável fortuna — ao longo dos anos, viria a adquirir iate, avião particular e múltiplas propriedades, entre elas uma casa de veraneio em Palm Springs, outra na França e a cobertura em Manhattan onde vivia.

Sua empresa, então, ocupava dois andares do imponente Lipstick Building, na Terceira Avenida. A esposa Ruth e os filhos, Mark e Andrew, tinham salas no 19 andar, conferindo ao ambiente uma atmosfera familiar, acolhedora, onde todos se orgulhavam de trabalhar, como alegam os ex-funcionários. O total oposto do que acontecia lá embaixo, no 17º andar.

Era lá que Bernie mantinha sua consultoria de investimentos secreta, fachada para um gigantesco esquema Ponzi. Frio, dissimulado, Madoff enganava tanto investidores leigos, aposentados, em geral, quanto outros tubarões financeiros, atraídos por promessas de lucros exorbitantes.

Bem distante do luxo e sofisticação do andar superior, o lugar era equipado com computadores de tela verde e impressoras obsoletas — isso em 2008, quando o FBI isolou o local para a perícia.

Uma confusão de pastas e livros de contabilidade subiam até o teto, e muitos dos funcionários fumavam em serviço, quando não iam até a “jaula”, uma sala onde se podia beber, cheirar cocaína ou até receber amantes. A operação era administrada por uma seleta equipe de vigaristas, gente de confiança, a maioria sem formação universitária, aliada de Madoff havia muitos anos.

“Bernie Madoff: O Golpista de Wall Street” destaca o caráter sociopata do protagonista, um sujeito desprovido de empatia, que amava apenas a si mesmo, a despeito de seu apego à família — alguns observam que Bernie não se importava com nada além da adoração a ele dirigida.

A narrativa é amarrada em depoimentos de vítimas, ex-funcionários e figuras-chave na investigação, como o contador Harry Markopolos, tal como numa reveladora entrevista com o próprio Madoff, realizada após sua prisão.

Na ausência de imagens de arquivo para cobrir toda a história, a série recorre à dramatização com atores, um recurso pouco atraente, mas que não fará tanta diferença no saldo final.

O diretor Joe Berlinger é um perito em documentários de crime verdadeiro, tendo realizado o indicado ao Oscar “O Paraíso Perdido: Assassinatos de Crianças em Robin Hood Hill” (1996) e vários episódios da série “Conversando Com um Serial Killer”.

Bernie Madoff: O Golpista de Wall Street – EUA – 2023. Dir.: Joe Berlinger Onde: Netflix / AA+

AAA Excepcional / AA+ Alta qualidade / BBB Acima da média / BB+ Moderado / CCC Baixa qualidade / C Alto risco

Por Luciano Buarque de Holanda, para o Valor Econõmico, de São Paulo

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