Nike faz movimento histórico, tira Adidas da seleção alemã de futebol e influencia mercado esportivo

- A Nike substituirá a Adidas como patrocinadora da seleção alemã a partir de 2027.
- A decisão surpreendeu o mercado, após mais de 70 anos de parceria entre a Adidas e a seleção.
- Especialistas apontam que a oferta financeira da Nike foi superior, motivada pela busca por rentabilidade.
- A mudança representa um golpe simbólico para a Adidas, mas pode ser um ganho estratégico para a Nike, aumentando sua visibilidade global.
- O impacto no mercado brasileiro é considerado pequeno, mas a visibilidade da Nike pode aumentar indiretamente.
- A decisão pode influenciar outras seleções a repensarem seus patrocínios.
A Nike é a nova patrocinadora da seleção alemã de futebol. O anúncio, feito pela Federação Alemã de Futebol (DFB) em 21 de março, surpreendeu boa parte do mercado especializado ao colocar fim à parceria com a Adidas, que somava mais de 70 anos de história. Um relacionamento antes de tudo marcado por quatro conquistas de mundiais masculinos e duas conquistas de mundiais femininos. Com isso, a partir de janeiro de 2027, a marca americana é a que estampará os uniformes alemães.
“Não era algo que todo mundo esperava, até pelo tempo de parceria com a Adidas”, afirma Marcelo Toledo, sócio da 3.0 Marketing & Inteligência e professor da ESPM. “Ainda que houvesse rumores desde o início das negociações, porque o processo da Federação Alemã de Futebol foi extremamente transparente”, complementa.
Ulysses Reis, professor de varejo da FGV, concorda que a troca não era prevista, mas não tem dúvidas de que a motivação é financeira.
“A seleção alemã de futebol não tem se saído bem nos mundiais e até nos campeonatos europeus”, diz ele. “Com isso, tem perdido financiamento e patrocinadores, percentuais em eventos, ingressos, e acabou abrindo uma espécie de licitação em que quem deu o preço mais alto foi a Nike”, explica.
Faz sentido, já que o próprio CEO da DFB, Holger Blask, declarou que a escolha da Nike como futura fornecedora foi resultado de um processo de licitação transparente e não discriminatório e que a Nike apresentou, de longe, a melhor oferta.
Qual é a relação da Adidas com a seleção da Alemanha
De acordo com especialistas, a parceria da Adidas com a seleção da Alemanha é parte da identidade cultural do país. “Quando se pensava na seleção da Alemanha, se pensava na Adidas”, afirma Toledo.
Reis resgata um pouco a história da marca e explica que ela foi fundada na Alemanha em 1949 pelo empresário conhecido como Adi Dassler. “Ou seja, a marca nasceu quatro anos depois de o país ter perdido a Segunda Guerra Mundial, em um momento muito difícil”, destaca.
Com o tempo, ele afirma que a marca acabou se tornando um símbolo mundial gigante, que representa muito do que hoje entendemos por marketing esportivo, inclusive em relação ao valor dos jogadores e dos clubes. “Os alemães têm muito orgulho de ela ser uma empresa alemã”, diz o professor da FGV. “Ela não é apenas patrocinadora, é um símbolo de renovação, da volta do país aos trilhos”, complementa.
Nike x Adidas: quem ganha e quem perde
Os especialistas não têm dúvidas de que a perda do patrocínio da seleção pode pesar para a Adidas globalmente. “É um baita golpe simbólico para a marca, mesmo que financeiramente ela consiga se recuperar com outros contratos, como os (atuais) com Argentina e Itália”, afirma Toledo, da ESPM. Na sua opinião, perder a seleção alemã tira o peso das grandes conquistas históricas do futebol.
Reis lembra que a marca alemã vem perdendo valor há algum tempo e acredita que agora vá precisar recriar todo posicionamento de marca e trabalhar para que ela gere valor em outros países.
De acordo com Toledo, a decisão da Adidas de não bater a oferta da Nike indica que a empresa está mais cautelosa com os altos custos dos patrocínios esportivos, que a cada dia estão maiores.
“Pode ser que, neste momento, ela esteja priorizando a rentabilidade em vez de manter contratos históricos que já não se encaixam na sua estratégia financeira atual”, considera. Reis acrescenta que a empresa pode ter se apoiado também na crença de que a seleção alemã jamais deixaria de usar uma marca símbolo do país na área esportiva.
Efeito global para Nike
Em relação à Nike, Reis acredita que a parceria representa sua consolidação como marca esportiva mais forte do mundo. Toledo concorda que o acordo seja um grande trunfo globalmente. “Fechar um contrato tão simbólico em um território historicamente dominado pela Adidas, sem dúvida, dá uma super visibilidade e reconhecimento”, diz ele.
“A Nike se torna mais poderosa do que já é e vai usar a imagem do patrocínio da seleção alemã em muitos lugares”, complementa Reis. “Ou seja, vai sair em vitrines e propagandas, não só na Alemanha, mas na Europa, nos Estados Unidos, e em muitos outros países”, indica.
Ambos os especialistas acreditam que a iniciativa esteja alinhada com trabalho que a marca vem desenvolvendo nos últimos anos. “Eles têm investido em parcerias estratégicas com seleções de países como Croácia, Inglaterra, França, Holanda, Polônia, Eslováquia, Eslovênia e Turquia, por exemplo”, diz Toledo. “Também investem em clubes pelo mundo, como Barcelona, Paris Saint-Germain, Liverpool, Corinthians, para reforçar sua presença no futebol”, afirma.
Resultado é mais imprevisível na Alemanha
Na Alemanha, porém, é mais difícil prever o que vai acontecer. “Pode ser uma catástrofe para a Adidas”, prevê o professor da FGV. Mas também pode ser o inverso. “Talvez os alemães em vez de comprarem Nike voltem a comprar Adidas com mais força”, considera.
A imprevisibilidade também vale para a Nike, que talvez enfrente uma resistência inicial, já que muitos torcedores têm uma ligação forte com a Adidas e podem ficar desconfortáveis quando a camisa da seleção passar a estampar o Swoosh. “Acho difícil acontecer, mas é uma possibilidade”, considera Toledo. “No começo, talvez haja uma percepção de ‘falta de patriotismo’, mas isso tende a ser passageiro”, acredita.
Reis tende a ver a situação como mais desafiadora.
“Não sei se vai ser fácil convencer o público alemão a comprar produtos da Nike porque estamos lidando com uma situação que envolve orgulho nacional”, pondera. Na sua opinião, o patrocínio é uma jogada ousada tanto para a marca americana quanto para a Federação Alemã de Futebol (DFB), que focou o lado financeiro. “Os resultados vão depender da competência dos times e equipes de marketing e varejo”, avalia.
E a Federação Alemã de Futebol (DFB) como fica?
Na opinião de Toledo, deve haver uma divisão de opinião em relação à DFB. “De um lado, teremos pessoas que podem criticá-la por ser ‘pouco patriota’ e escolher uma marca estrangeira em vez da Adidas”, diz ele. “De outro, estarão aquelas que acham que o mais importante é que seja um contrato vantajoso para a equipe” acredita. “No entanto, não é nada que uma boa campanha nos campos não resolva”, afirma.
Reis é menos otimista. Na sua opinião, o impacto de estampar uma marca americana nos uniformes nacionais dificilmente será positivo para a DFB.
E no Brasil como ficam Nike e Adidas?
No Brasil, o impacto da troca de patrocínio na Alemanha provavelmente seja pequeno. “Os torcedores se identificam mais com as marcas dos times e seleções locais e a Nike já está bem conectada com o Brasil”, afirma Toledo. Ele considera, no entanto, que o aumento da visibilidade global da marca americana pode acabar ajudando as vendas de forma indireta por aqui.
A mudança na Alemanha pode influenciar outras seleções?
Por fim, será que essa mudança na seleção da Alemanha pode influenciar outras seleções? A resposta é sim, para ambos os especialistas.
Reis é categórico. “A briga é por dinheiro”, afirma. “Pode ser um alerta para outras federações e clubes repensarem seus patrocinadores e buscarem propostas melhores”, diz Toledo, para quem o caso alemão mostra que até parcerias antigas e tradicionais podem ser quebradas quando surge uma oferta muito mais vantajosa.
Reis destaca que a preocupação está do lado das marcas. “Depois da derrota da Adidas, fica claro que o mercado tem agressividade muito alta e que a disputa ficará cada vez mais acirrada”, afirma.
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