Empolgação do investidor estrangeiro enfrentará teste
Investimento direto não está eternamente imune ao efeito negativo de políticas como a deterioração das condições fiscais

O investidor estrangeiro começou o ano animado com o Brasil. Resta saber se a empolgação vai resistir às turbulências no mercado financeiro causadas pela invasão da Ucrânia pela Rússia na semana passada, e pelas eleições presidenciais no segundo semestre.
Em janeiro, o Investimento Direto no País (IDP) registrou saldo positivo de US$ 4,7 bilhões, o melhor resultado para o mês desde 2018, segundo o Banco Central (BC). O número é 35,4% superior ao ingresso registrado em janeiro de 2021. O IDP compreende a participação no capital de empresas locais e operações intercompanhias, que envolvem um crédito dentro do próprio grupo. São considerados fluxos de recursos estáveis e de longo prazo.
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O total de capital externo investido em janeiro superou as expectativas do próprio BC, que estimava entrada de US$ 3,2 bilhões, e a surpresa foi devida, em boa parte, ao aumento de 75% do reinvestimento de lucros em relação a dezembro. Os reinvestimentos de lucros não impactam os fluxos de dólares no mercado de câmbio porque os recursos se originam de resultados apurados dentro do país. Mas significam que o investidor está repicando a aposta no Brasil. Apenas US$ 307 milhões foram resultado de operações intercompanhia.
Os números preliminares indicam que fevereiro seguiu com fluxo expressivo de IDP. Do início do mês até o dia 18, acumulava US$ 8,9 bilhões, quase o dobro do registrado em janeiro. Nesse período, o BC não detectou o reinvestimento de lucros, mas sim operações comuns, algumas com valor individual mais elevado. A estimativa do BC é que o número feche o mês em US$ 10 bilhões, o que será o maior montante desde agosto de 2019, quando houve ingresso de US$ 11,2 bilhões.
Também está expressivo o fluxo de capital externo para aplicações no mercado financeiro, chamado de investimento em carteira, que se caracteriza por maior volatilidade e dependência do humor do mercado no curto prazo. Nesse caso, a entrada líquida foi de US$ 5,7 bilhões em janeiro, sendo US$ 2,2 bilhões em ações e fundos de investimentos e US$ 3,5 bilhões em título de dívida.
As parciais de fevereiro, até o dia 18, contabilizadas pelo BC, mostraram, porém, uma reversão dessa dinâmica. Apesar da alta dos juros, o que aumentou a rentabilidade da renda fixa, houve uma saída líquida de US$ 2,3 bilhões dessas aplicações, enquanto ações e fundos de investimento registraram ingresso de US$ 4,96 bilhões.
A expectativa do BC é de continuidade de recuperação da entrada de investimentos estrangeiros, depois de ter desabado no primeiro ano da pandemia. A estimativa do BC é que o IDP atinja US$ 55 bilhões neste ano, um patamar superior ao de US$ 46,4 bilhões registrado em 2021 e acima dos US$ 37,8 bilhões de 2020. Ainda assim, distante dos registros anteriores à pandemia. Em 2019, IDP totalizou US$ 69,2 bilhões. O ponto máximo foi um ano antes, em 2018, com US$ 78,9 bilhões.
O estoque de Investimento Direto no País diminuiu US$ 109 bilhões em 2020, ficando em US$ 765 bilhões, como mostra o Relatório de Investimento Direto, divulgado em dezembro. O número representa uma queda de 12,4% em relação a 2019. A redução foi sobretudo causada pelo efeito cambial, negativo em US$ 140,1 bilhões. Ainda assim foram menos voláteis do que os investimentos em carteira e outros como empréstimos e créditos comerciais. Do total de Investimento Direto no País registrado em 2020, US$ 521,3 bilhões se referiam à participação direta no capital, e US$ 244,1 bilhões a operações intercompanhia. Das participações em capital, quase 60% estavam no setor de serviços, 30% na indústria, 10% na agricultura. Os percentuais correspondem à distribuição do PIB. Há dez anos, estavam 45% em serviços, 39% na indústria e 16% na agricultura.
Os dados de 2021 ainda não estão disponíveis, mas é bastante provável que o efeito do câmbio tenha novamente reduzido o volume do Investimento Direto no País. O IDP é considerado a fonte mais estável de financiamento do balanço de pagamentos e tem funcionado assim no Brasil. Até mesmo em 2020 quando encolheu devido à crise global causada pela pandemia, foi suficiente para cobrir o déficit em conta corrente. O mesmo aconteceu no ano passado. Mesmo sendo inspirados por uma avaliação de longo prazo da economia do país, o investimento direto não está eternamente imune ao efeito negativo de políticas como a deterioração das condições fiscais, o menosprezo pelas práticas ambientais corretas ou os ataques inspirados por antipatias pessoais.