Minerais críticos e estratégicos: um novo tipo de Guerra Fria

Brasil pode se tornar um protagonista global caso saiba aproveitar as oportunidades criadas pelas mudanças geopolíticas
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  • A transição energética global acirra a disputa por minerais críticos, criando uma “Guerra Fria Verde”.
  • Países como EUA e China competem por recursos, redesenhando alianças comerciais.
  • O Brasil, rico em minerais, tem oportunidade histórica, mas enfrenta riscos de perda de soberania e desindustrialização.
  • Investimento chinês no setor mineral brasileiro cresce, com aquisições recentes totalizando US$ 840 milhões.
  • É crucial uma estratégia nacional que equilibre atração de investimentos com desenvolvimento sustentável e soberania.
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O tarifaço de Donald Trump tem dominado os holofotes do noticiário econômico e com razão, já que tem implicações globais. Mas essa dominância na mídia acaba abafando outras pautas importantes.

Temas que vão desde a crise de dívida de países emergentes, a desaceleração da economia chinesa, os impactos trazidos pela evolução da IA, inflação persistente na Europa.

Sem falarmos em pautas locais de grande relevância, como a implantação da Reforma Tributária, a questão do crédito e endividamento das famílias, a questão climática entre outras.

Um dos assuntos de maior importância e que está sendo deixado de ser discutido de maneira mais firme é um novo tipo de guerra fria criada pela transição energética e de minerais críticos.

A transição energética global tem intensificado a busca por minerais críticos essenciais para tecnologias de baixo carbono, como baterias de veículos elétricos e sistemas de energia renovável.

Este novo momento está sendo chamado de “Guerra Fria Verde”.

A crescente disputa por minerais críticos e estratégicos no contexto da transição energética está redesenhando o xadrez geopolítico global.

Consequências geopolíticas da corrida por minerais críticos e estratégicos

Disputa por recursos naturais

Da mesma forma que o petróleo foi o pivô de conflitos e alianças no século XX, hoje os minérios críticos estão no centro da disputa. Países como EUA e China, além da União Europeia, correm para garantir acesso estável a esses recursos, inaugurando uma nova forma de guerra comercial.

Reorganização de alianças comerciais

Países com reservas estratégicas, tais como Brasil, Chile, Argentina, República Democrática do Congo, Indonésia, estão se tornando peças-chave em novas alianças.

Por outro lado, a China usa investimentos diretos (FDI – Foreign Direct Investment) e acordos bilaterais como instrumentos de “soft power econômico”.

Os EUA, por sua vez, tentam responder com alianças como o “Minerals Security Partnership”, incluindo Austrália, Canadá e países latino-americanos.

Desglobalização seletiva

Há uma tendência crescente de transferência de cadeias produtivas para países aliados politicamente – movimento conhecido como “friendshoring”.

Risco de novas dependências

A alta concentração de refino e processamento de minerais na China (mais de 60% das cadeias globais de lítio, por exemplo) levanta temores da geração de uma “OPEP 2.0” — onde a China passe a exercer uma influência desproporcional sobre os preços e fornecimento.

E o Brasil nessa história de minerais críticos?

Para o Brasil, país rico em recursos naturais estratégicos, essa situação pode representar uma oportunidade histórica.

Bem claro que, também, que existirão riscos e pressões que demandam atenção diplomática, econômica e ambiental.

Podemos nos tornar um protagonista global caso saibamos nos aproveitar das oportunidades criadas pelas mudanças geopolíticas, tais como:

  • O nosso solo rico tem atraído os interesses internacionais, especialmente da China.
  • Como fornecedor confiável desses minerais críticos ficamos alinhados com compromissos ESG (ambientais, sociais e de governança).
  • Poderemos nos fortalecer em fóruns internacionais como G20, BRICS e COPs climáticas.
  • Atração de investimentos estruturantes ligados a infraestrutura, pesquisa e cadeias industriais.
  • Poder de barganha aumentado, assim podendo obter melhores termos em negociações com grandes potencias.

Por outro lado, podemos estar frente a riscos como:

  • Perda de soberania sobre recursos estratégicos caso ocorra a venda irrestrita de minas e ativos logísticos que podem comprometer o controle nacional e limitar a industrialização interna.
  • Pressões diplomáticas crescentes: podemos acabar em meio a disputa China e os EUA. Algo que pode comprometer nossa tradicional posição de não alinhamento.
  • Desindustrialização mineral: caso exporte apenas matéria-prima, o país corre o risco de repetir o ciclo de “produtor primário”, perdendo valor agregado e empregos qualificados.
  • Conflitos socioambientais: O aumento da mineração em regiões sensíveis – como o Cerrado e a Amazônia Legal – pode gerar tensões com comunidades locais, povos indígenas e organizações internacionais.

Investimentos em minerais críticos no Brasil

Nos últimos anos, empresas chinesas têm ampliado sua presença no setor mineral brasileiro. Embora o setor elétrico tenha sido o principal destino dos investimentos chineses, com 39% dos aportes em 2023, a mineração também tem recebido atenção significativa.

Entre 2007 e 2023, o setor de mineração atraiu cerca de 6% do total dos investimentos chineses no Brasil, totalizando aproximadamente US$ 4,4 bilhões.

O ano de 2024 registrou um total de 30 operações de fusões e aquisições no setor de mineração brasileiro, representando um aumento de 42,85% em relação a 2023. Esse número é o maior dos últimos 20 anos, indicando um mercado aquecido e uma busca crescente por ativos ligados a minerais críticos.

Somente entre novembro de 2024 e fevereiro de 2025, os investimentos chineses em minerais críticos no Brasil somaram aproximadamente US$ 840 milhões, considerando as aquisições da Mineração Taboca e dos ativos de níquel da Anglo American.

O setor mineral teve um papel crucial na balança comercial brasileira, sendo responsável por 47% do saldo positivo em 2024. As exportações de minérios, especialmente de minério de ferro, foram determinantes para esse resultado.

O Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) estima que, entre 2025 e 2029, os aportes no setor de minerais críticos no Brasil possam alcançar pelo menos US$ 14 bilhões, com a China sendo um dos principais investidores.

Esse cenário ressalta a importância de uma estratégia nacional que equilibre a atração de investimentos estrangeiros com o desenvolvimento sustentável e a soberania sobre recursos estratégicos.

A disputa pelo controle de recursos e dominação das cadeias produtivas deve moldar a economia mundial no futuro. Estamos entrando numa guerra comercial dramática e mais danosa que as disputas comerciais tradicionais.

Como estamos assistindo o Brasil, com sua riqueza mineral, tem posição estratégica nesse tabuleiro.

A partir desse entendimento, uma questão emerge:

Estamos preparados para jogar esse jogo com protagonismo?

Não está sendo visto uma estratégia concreta de nossa parte. A venda de ativos minerais a grupos estrangeiros está acontecendo sem um debate ou diretrizes que preserve o nosso interesse.

Nota-se, por outro lado, o governo brasileiro tem tomado algumas ações, como a publicação do “Guia para o Investidor Estrangeiro em Minerais Críticos para a Transição Energética no Brasil” que fornece orientações aos investidores, enfatizando a necessidade de alinhamento com as regulamentações nacionais e práticas responsáveis.

Além de ações do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM).

No entanto, precisamos agir com mais firmeza, foco e urgência. Ainda mantemos o inconveniente ciclo de exportação de matéria-prima e importação de bens com alto valor agregado, deixando de aproveitar a oportunidade histórica de romper com essa lógica.

O governo tem que propor uma política nacional para minerais críticos que estabeleça prioridades claras e que preserve os biomas sensíveis.

É preciso fortalecer agências reguladoras como Agência Nacional de Mineração (ANM) e IBAMA. Criar uma política industrial voltada à cadeia de valor de minerais críticos. Atuar com diplomacia inteligente, sem cair em armadilhas de dependência geopolítica.

Somente se agirmos com coragem e visão é o teremos um lugar de liderança no mundo que está por vir.

Não precisamos de armas para destruir um país — basta explorá-lo no silêncio de seu subsolo.

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