Milei ironiza economistas após peso argentino surpreender

O peso argentino desafiou as expectativas de muitos analistas e evitou uma forte queda depois da mudança do regime cambial em abril, o que levou o presidente libertário do país, Javier Milei, a caçoar dos economistas que haviam previsto uma desvalorização muito maior.
O peso oscilou muito desde que passou a poder ter uma flutuação parcial em 14 de abril. No entanto, na quinta-feira (24) a moeda era negociada a 1.175 pesos por dólar, em comparação à cotação de 1.068 de antes da mudança, em um nível bem mais forte do que o teto de 1.400 estabelecido pelo banco central, e Milei previu que em breve atingirá o piso de 1.000.
Na segunda-feira, quando o peso estava se fortalecendo próximo ao seu valor pré-flutuação, Milei criticou Martin Rapetti, diretor do centro de estudos econômico Equilibra, que havia previsto uma forte desvalorização, chamando-o, no X, de “econopicareta… que se dedica a envenenar o sangue da população”.
Rapetti disse ao “Financial Times” que a publicação foi “uma tentativa de intimidar” economistas que questionam as políticas de Milei e “inapropriada para o presidente de um país sério e democrático”.
Ministro da economia
O ministro da economia da Argentina, Luis Caputo, também expressou frustração com os que previram uma maior desvalorização do peso.
“Seria de se esperar uma enxurrada de colegas e jornalistas pedindo desculpas por dizerem às pessoas que tínhamos desvalorizado (quando a flutuação da moeda foi anunciada), mas certamente (isso) não vai ocorrer”, disse no X.
Ao contrário do início de abril, o banco central não está intervindo no mercado para sustentar o peso, de acordo com os termos do novo acordo de empréstimo de US$ 20 bilhões de Milei com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
O FMI pediu ao banco central argentino para não vender suas preciosas reservas de moeda forte para fortalecer o peso, a menos que ele se desvalorize para 1.400 por dólar, e, em vez disso, o encorajou a comprar dólares para acumular reservas. Milei disse na semana passada que o banco central não compraria dólares “até o peso chegar a 1.000”.
Condições favoráveis
Embora o peso tenha se enfraquecido nos últimos dias, a maioria dos analistas agora concorda que as condições estão a favor de Milei para manter a moeda na metade inferior de sua faixa pelos próximos meses, também levando em conta um impulso sazonal de dólares da enorme colheita de soja da Argentina entre abril e junho.
A taxa referencial de juros da Argentina, de 29%, permanece alta o suficiente para encorajar investidores a realizar o chamado “carry trade”, operação na qual captam empréstimos em dólares e os trocam por pesos para comprar ativos locais e ganhar os juros. Na semana passada, o banco central relaxou as restrições aos investidores estrangeiros para incentivar tais operações.
Por sua vez, Milei reduziu drasticamente a impressão de dinheiro pelo banco central e reiterou a promessa de obter um superávit orçamentário em 2025, o que ajuda a dar confiança aos investidores.
“Eles colocaram muitas variáveis em jogo que aumentam a oferta de dólares no mercado e reduzem a demanda, incluindo a sinalização de Milei de que o peso atingirá o limite superior”, disse Fernando Marull, chefe da firma consultoria econômica FMyA, de Buenos Aires.
Volatilidade
O peso deverá continuar volátil nas próximas semanas, acrescentou Marull, uma vez que o mercado “testa a oferta e demanda” de uma moeda cuja taxa de câmbio foi controlada pelo governo por mais de cinco anos.
Um fator crucial será a rapidez com que os exportadores agrícolas optarem por vender suas colheitas. Um peso mais forte incentiva os exportadores a segurar a venda, pois receberiam menos pesos por seus dólares de exportação. Milei, contudo, advertiu que um corte temporário nos impostos de exportação vencerá em junho e os conclamou a vender agora.
A pressão sobre o peso pode se intensificar na segunda metade do ano, à medida que os dólares de exportação sequem e as eleições parlamentares de meio de mandato da Argentina, em outubro, se aproximem. Tradicionalmente, os investidores convertem seus ativos em pesos para dólares antes de eleições.
Inflação
A desvalorização menor do que a prevista na moeda levou alguns economistas a abandonarem projeções de que a inflação daria um salto assim que os controles cambiais fossem suspensos. Controlar as pressões de preços é central para a campanha de Milei para as eleições parlamentares.
“Não vejo um problema sério com a inflação, a menos que o peso caia muito”, disse Rapetti, da Equilibra.
Ele disse, contudo, que é cedo demais para Milei declarar vitória em manter um peso mais forte, tendo em vista que a taxa de câmbio se valorizou drasticamente nos últimos 12 meses e em termos reais permaneceu muito acima de sua média histórica.
“Ainda acredito que, para colocar o país em um caminho que permita tanto uma economia em crescimento quanto reservas do banco central em crescimento […] a Argentina precisa de uma taxa de câmbio mais fraca”, disse Rapetti. “O governo conseguiu, de forma muito inteligente, adiar isso.”
*Com informações do Valor Econômico
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